18 dezembro 2009

Modelo híbrido vai financiar a cultura

Antes mesmo de aprovado, novo fundo aplicará R$ 800 milhões em incentivo direto - e a velha lei continuará ativa

O ministro da Cultura, Juca Ferreira, apresentou ontem pela manhã na Câmara dos Deputados, em Brasília, o projeto da nova Lei de Fomento e Incentivo à Cultura, que substituirá a Lei Rouanet (8.313, de 1991). Dezenas de artistas compareceram ao ato, entre eles os diretores Zé Celso Martinez Corrêa e Aderbal Freire-Filho, o maestro John Neschling, as cantoras Fernanda Abreu e Sandra de Sá e o coreógrafo Ivaldo Bertazzo.

A grande novidade do projeto é o acionamento de um fundo público de incentivo direto à cultura, o Fundo Nacional de Cultura - o mecanismo já tem recursos de R$ 800 milhões para funcionar em 2010, e vai funcionar independentemente da aprovação da nova lei, segundo afirmou ao Estado o secretário executivo do MinC, Alfredo Manevy.

O MinC pretende manter um regime híbrido de financiamento à cultura em 2010, com a velha Lei Rouanet funcionando normalmente (enquanto se espera o trâmite da nova lei no Congresso), e ao mesmo tempo irrigar a cultura com o dinheiro do fundo. "O fundo é direto na veia. Aprovado o projeto, o produtor recebe o dinheiro", disse o ministro Juca Ferreira.

Questionado se essa mudança não iria desestimular as empresas a conceder patrocínio, o ministro afirmou que, atualmente, apenas 5% dos recursos aplicados por meio da Lei Rouanet vêm da iniciativa privada - 95% já são recursos públicos. Aprovada, a nova lei revoga a lei anterior. "A nova lei está para a Lei Rouanet assim como a Lei Rouanet estava para a Lei Sarney. É um aperfeiçoamento. A Lei Rouanet não continha sequer a palavra critério. Ficou marcada
pela concentração, pela confusão, pela injustiça", explicou Alfredo Manevy.

O projeto de lei resulta de debates e estudos que o Ministério da Cultura promove desde 2003. Nos últimos meses, o texto foi submetido a consulta pública na internet, e foram realizados debates em 19 capitais. Manevy disse que respeita os críticos do projeto, como Odilon Wagner, da Associação de Produtores Teatrais Independentes (APTI), mas considera que são sempre os mesmos e que tentam interditar o debate.

"São três ou quatro beneficiários. Diziam que a lei estava paralisada, e mesmo na crise a gente teve investimento.

Do jeito que falam, parece que as empresas estão prestando um favor à cultura, e não se trata de um favor", ponderou. Segundo Manevy, 3% das empresas captam 50% de todo o dinheiro do incentivo, e mais de 8 mil projetos não captam nada.

Ainda assim, Manevy acredita que não cairá o valor destinado à renúncia fiscal pela Lei Rouanet no próximo ano. O montante será de R$ 1 bilhão. Com a aprovação da nova lei, o governo estima que esse valor subirá 20%, por conta da imposição, no texto, de que as empresas invistam ao menos 20% em projetos incentivados (os tetos de renúncia fiscal são apenas três agora: 40%, 60%, 80%). A nova lei prevê que 30% do recurso do Fundo Nacional de Cultura (FNC) sejam
destinados automaticamente a Estados e Municípios.

O governo considerou um erro o anúncio da criação de um "escritório público de financiamento", expressão contida em cartilha distribuída pelo governo anteontem sobre as mudanças. A expressão foi suprimida do material distribuído à imprensa ontem. Um dos objetivos da mudança, informa o MinC, é democratizar o acesso aos recursos.

No Senado Federal, era ansiosamente aguardada ontem a votação do chamado Simples da Cultura. Trata-se de Projeto de Lei Complementar Câmara (200/09), que altera a alíquota de tributação para produções cinematográficas, artísticas e culturais. Se aprovado, o mecanismo mudaria as empresas de produção cultural para o Anexo 3 do Supersimples, alteração que reduz de 15% para 4% a tributação do setor. "É uma desoneração importantíssima e urgente, que
significa uma queda de mais de 100% na carga tributária da cultura", observou Manevy.

O MinC vê o tema como suprapartidário. "A concentração da Lei Rouanet é muito grande. Mais de 20 Estados recebem menos de 2% dos recursos. O Acre recebeu zero este ano. Como o Congresso é muito ligados às suas bases, todos veem esses números com muita preocupação", disse Manevy.
Fonte: O Estado de S. Paulo (17/12/2009)

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