30 abril 2006

Conto #9 - Destino... existe?

Conto #9 (de 19),
do 1º Concurso "Janete Clair" de Criação Ficcional
do Grupo Roteiros para Televisão (GRTV-Yahoo)


Destino... existe?


O restaurante decorado em alto estilo estava vazio, um garçom fingindo limpar os copos olha distraidamente o grande empresário Douglas com ar de pena, em uma mesa próxima a janela olhando sem ver a paisagem lá fora, um enorme edifício com dizeres coloridos, ostentando luxo e bom gosto. Douglas leva lentamente o copo aos lábios, percebe que esta vazia, olha a garrafa vazia pede outra, seu olhar se perde fixando em algo que somente sua mente pode ver. O telefone torna a tocar. Mecanicamente ele atende.
Do outro lado a voz de sua mulher Dora soa estridente nervosa
- Douglas onde você esta?Já é a décima vez que te ligo nas ultimas duas horas.
Douglas responde friamente – estou chegando, se não ligasse tanto com certeza eu já estaria ai-.
A voz continua – não seja hipócrita, com quem você esta?O que esta fazendo?
Douglas coloca o celular ao lado do copo e continua a olhar o nada .Sua mulher continua falando -seu irresponsável, mulherengo, você viu os gráficos? Estamos tendo uma perda enorme em três das nossas filiais, se continuarem vamos fechar as portas logo, logo,e você fica ai escondido sem fazer nada, o que acontecendo?
Ele pega o celular – não esta acontecendo nada! Recoloca o tel. na mesa.
- Como não?Faz três meses que esta ausente, quase não aparece na firma, olha aqui Douglas se te pego com outra eu te mato, sabe que não aceito outra mulher na sua vida, você é meu somente meu ouviu?Estou contratando um detetive você vai me pagar !.
Ela desliga.
Ele continua a beber. Pega o celular olha a caixa de mensagens 35 mensagens de sua esposa, retira a gravata , o paletó do terno feito sobe medida, chama o garçom, Douglas lhe entrega o terno , a gravata, retira o relógio , a pulseira , o cordão de ouro fino , tira da carteira uma maço de notas e da ao garçom - é tudo seu –
O Garçom fica olhando penalizado, um homem tão rico e poderoso e tão infeliz.
Douglas o olha nos olhos – Roberto o poder é uma prisão, deixamos de viver preocupados com a sociedade, com o lucro, querendo sempre mais, não temos nem mesmo o direito de ficar a sós conosco mesmos, eu já fui como você, pobre, mas livre.
O telefone começa a tocar novamente ele pega o telefone desliga e entrega para o garçom, é tudo seu.
Sai do restaurante olha o prédio em frente, o manobrista se aproxima.
- Doutor quer que traga o carro ou vai para o escritório?
Douglas olha o manobrista com o mesmo olhar ausente
- Pode me trazer, por favor!
Alguns minutos depois o manobrista lhe entrega a chave ele entra no carro, o telefone começa a tocar, ele deixa tocando, liga o radio, uma musica suave começa a tocar. Douglas da um sorriso e diz numa voz de saudade - Estela
Ele dirige sem saber ao certo pra onde vai, fica rodando pelas ruas, o sinal abre, ele não vêem, outros motoristas começam a buzinar, olha para o motorista do outro carro, seu coração dispara, no outro carro uma loira lhe sorri, a covinha que se forma próximo aos lábios lhe chama a atenção, pois deixa a mostra um pequeno ponto negro bem no meio, Estela, os carros continuam a buzinar ele meio perdido, o carro ao lado vai embora, tenta segui-lo, mas se perde sem saber pra onde foi.
Novamente o tel. tocando. ele começa a falar sozinho.
- Dora nós ate que poderíamos ser felizes, se não fosse seu ciúme doentio, se pudesse me dar um filho para que cuidasse da nossa empresa, se me deixasse respirar, chega Dora não agüento mais, ver você 24 horas por perto, ver você vasculhando meu sentimento e meu pensamento, Estela, como teria sido minha vida com você?Com certeza seria mais feliz, devia ter voltado e me casado com você, mas Dora era a mulher ideal, ambiciosa como eu, éramos iguais, achei que os anos me faria te esquecer, o grande e único amor que tive na vida.
Douglas não percebe que entrou na rodovia, que esta começando a escurecer, perdido em seus devaneios.
Em certo ponto da estrada passa por cima de uma pedra o motor desliga
- Droga agora vou ficar aqui por mais de uma hora ate ele esfriar, meu fusca com certeza não me deixava mão, ultimo modelo, proteção contra acidente , balançou , desligou, nova tecnologia, que disparate tudo em nome do poder!
Ele sai do carro vê uma luz acesa numa pequena casinha a poucos metros da estrada
- estou com sede
Ele se dirige para o casebre uma senhora bem velha o atende com um sorriso.
- Estava te esperando meu filho!
- Me esperando? – ele se assusta
- Sim vi quando seu carro desligou, imaginei que tinha sede vamos entre.
Douglas entra na pequena sala se senta em uma cadeira em frente à mesa varias maças
A velha senhora o olha – Você me parece triste, vazio, buscando algo do passado, não esta feliz com seu presente?
- Ele se assusta – Como à senhora percebeu?
- Meu filho já vivi centenas de luas, aprendi a conhecer os olhos humanos, o olhar é a única coisa que é impossível disfarçar no coração humano, ele reflete as palavras que não são ditas, que se escondem no fundo da alma.
- Talvez tenha razão, tenho me sentido perdido e sozinho, o amor de minha esposa sufoca a ponto de me faltar o ar. tenho questionado como seria minha vida ao lado da única mulher que amei , simples, humilde, sua vontade era apenas de amar
- Porque a deixou? Pergunta à velha
- Porque eu queria mais, queria status, poder, ela não se ligava muito nessas coisas, ela queria amor, sexo, eu queria poder dinheiro, me pergunto se seria o executivo que sou hoje, se ainda seria feliz como antes.
Ela lhe estende uma maça - prove uma, são recheadas com morango recobertas com mel puro, você com certeza seria sim o executivo que é, pois sua ambição já era grande.
Agora vá seu destino lhe espera. leve essa maça com cuidado pode querer voltar .
Douglas sem entender coloca a maça embrulhada em um papel vermelho no bolso e sai em direção ao carro.
Ainda ouve a voz da velha mulher dizendo – se precisar voltar.
Ele entra no carro o tel. para de tocar. Começa a cantar, entra em uma rua, estranha, pois nunca a tinha visto, uma casa vermelha de janelas amarelas lhe chama a atenção e tem vontade de parar encosta o carro, nesse momento duas crianças de mais ou menos 8 e 10 anos abrem a porta correndo – Mamãe o papai chegou, o papai chegou!
Douglas se perde e as crianças o abraçam, tenta falar e não consegue, a porta se abre novamente e Estela sai uma roupa semitransparente, Douglas sente uma raiva repentina ao olhar a mulher ao mesmo tempo em que fala consigo mesmo – é um sonho, bebi demais, isso não esta acontecendo.
As crianças o levam pra dentro, Estela entra antes que ele alcance a porta, Douglas percebe que esta bêbado.
Na sala Stela o olha com ódio,
Douglas vê os braços e pernas da mulher cheias de hematomas, sua raiva cresce.
Seus pensamentos não batem com as palavras que diz.
Pensa em dizer – Estela que bom te encontrar, são seus filhos?Chamaram-me de pai... mas sua voz sai assim – que porcaria de roupa é essa? Como pode atender a porta desse jeito?Aproxima-se cambaleando, Estela se afasta,
- Não Douglas agora chega estou indo embora acabando de arrumar minhas malas, não agüento você, sua bebida, sua perseguição, é um doente isso que você é.
- Você não vai alugar nenhum, é minha esposa, é sua obrigação ficar comigo e cuidar de mim e de nossos filhos, da nossa empresa, -Ele se desespera – Meu deus o que estou falando o que esta acontecendo comigo!
- Chega Douglas o que você fez ontem não tem perdão, - jogando nele um jornal, eu não agüento mais tanta vergonha e humilhação,
Douglas olha o jornal perplexo, sua foto brigando um de seus melhores clientes.
Estela – Não vai ler Douglas? Atirou-se sobre o pobre coitado apenas porque ele foi gentil e estava amarrando minha sandália, porque estou com o braço quebrado que você quebrou no mês passado,
Douglas enlouquecendo não consegue falar, Estela sai, as crianças olham escondidas atrás da porta, um dos meninos se aproxima do pai.
- Papai não fica assim, gosto do senhor, mas quando bebe tenho medo que bata em mim como bate na mamãe!
O outro também se aproxima, mas fica de longe olhando- o com raiva – se o papai bater na mamãe de novo eu mato ele!
Douglas começa a chorar desesperado – O que esta acontecendo? isso aqui não é minha vida, esses não são meus filhos, essa dor, esse medo de perder! Essa mulher não existe, essa casa não existe, não estou bêbado o que acontecendo!
A voz da velha senhora lhe soa no ouvido – Filho tem nas mãos o destino que procurou,as respostas que queria ,siga seu caminho. boa sorte
A voz e a imagem se apagam – A velha foi a velha que me enfeitiçou, água que bebi , estou preso nessa vida, minha mulher Dora, minha casa, meus amigos, tudo se perdeu, nada existe mais! Nem mesmo controle emocional, já não sei mais o que digo,essas crianças tem medo , me odeiam, Stela me despreza, só falta descobrir que fiquei pobre!- ele da socos na parede, quebra os moveis as crianças fogem assustadas Stela entra segurando uma mala - Mando buscar as crianças.
Ele continua gritando - Você não vai embora, é a culpada de tudo isso que esta acontecendo, 10 anos te amando, te desejando, a culpa é sua.
- Stela decidida levanta a cabeça- Não à culpa é sua dez anos me vigiando, me atormentando, não me deixa viver, gasta horrores com detetives, vasculha a casa toda, nem trabalha, a empresa continua em alta, mas não por você, pelo Mauricio seu administrador, pois você não consegue ficar um minuto longe sem me perseguir, chega dessa vez é para sempre!.
- Você não entendeu - diz Douglas,- Essa não é minha vida, esses não são meus filhos!
- Sempre falou isso, tem razão é verdade não são seus filhos, você é louco doente.
Douglas ouve sua voz dizendo-Sou louco por você, tenho medo de te perder, você me trata como se não me conhecesse! Como se não me amasse mais, tudo que faço pra chamar sua atenção é inútil, só pensa na casa e nos seus filhos, não tem lugar na sua vida pra mim, vive de porta em porta, asilo, creches sei lá mais o que, mas prefiro te matar do que te perder .
Stela sai fechando a porta, ele sai atrás sem poder se conter, tentando se segurar, mas uma força o impele – maldita velha me devolve minha vida, devolva os dez anos que tomou maldita – enquanto entra no carro e sai em disparada atrás de Stela.
Ele vê o carro dela parado próximo ao banco, sai do carro e vê seu advogado aproximar de Stela o homem a abraça ele tira o revolver e da dois tiros em cada um .
Na calçada um pano vermelho, ele abaixa pega o pano enrola o revolver coloca no bolso esquerdo, senta na calçada e começa a chorar – Devolva minha vida, por favor.
Uma folha de jornal vem voando e cai em seus braços ele olha a manchete-PODEROSO EMPRESÁRIO MATA A SANGUE FRIO A MULHER E SEU ADVOGADO –
Douglas envia a mão no bolso direito desembrulha e leva a arma na cabeça , quando vê que era a maçã ,nervoso vai jogar a maçã no lixo – Maldita nem minha arma eu tenho mais , nem me matar eu consigo , começa a chorar - Dora me perdoe o que te fiz o que fiz a mim, a nós, Agora eu entendo você, eu tinha tudo que quis, mas não dei nada de mim, seu ciúme doentio fui eu que causei não tendo tempo pra você, não te dei atenção envolvido em ser o todo poderoso, não te amei como devia, te culpo por não me ter me dado filhos quando na verdade eu não saberia como amá-los, te culpo por não me deixar respirar quando na verdade eu é que estou morto, nossa vida foi roubada, não existe mais, nem mesmo morrer eu consigo, só me resta pedir me perdoe, pois agora sei que quem te levou a ser assim fui eu, procurando dentro de mim o fogo da paixão do passado, esquecendo o amor verdadeiro do presente , e te perdi, perdi minha vida, os dez anos mais felizes que um homem pode ter.
Ele chora olhando a maçã e sem perceber da uma mordida nela.
Batidas fortes no vidro do carro o assusta, Douglas acorda olhando pra os lados .
Sai do carro, policiais o ajudam Dora chorando o abraça – Meu amor pensei que tinha morrido, nunca mais faça isso comigo!.
- O que aconteceu... eu não entendo onde estou?
- Meu amor, você passou sobre uma pedra, o carro travou e você acabou batendo em uma arvore, alguém avisou a policia, quase enlouqueci, nunca mais faça isso comigo.
Douglas abraça a esposa fortemente - Então estou vivo, era um sonho, ainda tenho minha vida, meus 10 anos estão de volta nunca mais vou me importar com seu ciúme, quero somente ficar ao seu lado, recuperar dez anos que não te amei suficiente.
- Meu amor, seu amor, sua atenção, seu carinho, me sentir especial na sua vida é a única coisa que quero, alem é claro de continuar sua sócia no nosso império.
Uma velha com um cesto cheio de maças se aproxima Douglas reconhece velha
Dora- Veja que linda maça deve estar um delicia!
Douglas apavorado reconhece a velha – Não toque nessa maçã!
- Dora – Ora Douglas é apenas uma senhora tentando sobreviver e pega uma maça
Dora -Qual o nome da senhora?
A velha responde
-Meu nome é destino.
Dora – Destino... Existe?
A velha responde sorrindo se afastando – acredite se quiser
Douglas pega a maça da mão da esposa e a joga pro ar
ela o olha admirado – Douglas porque fez isso?
- Porque quero te beijar e nunca mais ficar longe de você.

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